quinta-feira, 31 de março de 2011

ARTIGO CONTRA A TERCEIRIZAÇÃO DA SAÚDE



NÂO À TERCEIRIZAÇÃO !

 O tecnicismo que se desenvolveu espantosamente ao longo do século XX fez com que a medicina perdesse a visão do ser humano como uma totalidade. Partes do seu corpo são atendidas por profissionais cada vez mais especializados na sua área de conhecimento. Ao mesmo tempo, a tecnologia armada, que na medicina cresce de forma aditiva e nunca substitutiva, encareceu assustadoramente o atendimento. Por razões diversas, os serviços públicos delegaram aos serviços privados o atendimento especializado. Delegar uma atividade originalmente de sua responsabilidade a um terceiro é uma prática antiga. Embora responsabilidade do Estado (a Constituição Federal de 1988 determina que ?A saúde é direito de todos e dever do Estado? ? Título VIII, Da Ordem Social, Seção II, Da Saúde, Art. 196), a maior parte das internações hospitalares e consultas especializadas do serviço público, inclusive em Maringá, é realizada por serviços privados. Portanto, terceirizada. ?Terceirizar? é um eufemismo para ?privatizar. Não existe ilegalidade nesta prática, mas a lógica que a movimenta é a do livre-mercado, da saúde/doença como fonte de lucro. Exames são excessivamente solicitados, como se fosse possível utilizá-los em substituição ao velho e bom raciocínio clínico. Não sou contra a tecnologia, mas sim que ela esteja permanentemente a serviço do homem e não o contrário. A remuneração feita pelo número de doentes atendidos no mínimo cria uma enorme contradição para um serviço que se diz ?de saúde?: quanto mais doença houver, maior a possibilidade de ganho. Para limitar os gastos, limita-se o número de atendimentos e congela-se a remuneração. Desnecessárias maiores considerações sobre o grau de insatisfação da população quanto à qualidade dos serviços e dos profissionais que recebem pelos atendimentos realizados. O modelo privado de assistência médica, com todas estas distorções, não serve de exemplo para nenhum outro serviço. Observem: não estou me referindo às distorções do sistema público, mas sim do modelo privado de assistência médica. Aqueles que utilizam seguros ou convênios de saúde e que enfrentam verdadeiros cardápios de doenças que nunca poderão ter (como se tivessem o direito de escolher!), limitações do número de consultas e exames, ou filas de espera tão longas quanto e, por vezes, até maiores que às do serviço público, sabem muito bem do que estou falando. Assim posto, a idéia de que o serviço de saúde privado é melhor do que o público não tem a mínima sustentação. Por vezes o público dá melhores respostas. Vejam o exemplo da Aids? O atendimento público brasileiro para aqueles que têm esta doença é modelo para a Organização Mundial da Saúde, enquanto os planos e seguros privados de saúde só o fazem depois de muita discussão judicial. Terceirizar ainda mais o atendimento aos que já estão doentes seria o mesmo que aprofundar as enormes distorções já existentes. Delegar o que hoje é realizado, e muito bem, pelos serviços públicos, como por exemplo, o programa de vacinação, seria assinar o atestado de completa incompetência gerencial. Sem pensar em como ficaria o controle social, previsto em lei e que se tenta legitimar a duras penas.
Cabe sim perguntar se não seria necessário propor novos modelos de gestão para os serviços públicos, que os tornem mais ágeis e resolutivos. O atual ministro da Saúde, José Gomes Temporão, aponta nesta direção. Vamos acompanhar.
* Paulo Roberto Donadio, médico
Ex-secretário de Saúde de Maringá; professor da UEM
 

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